Kill The Dead (2010) de Richard Kadrey

by - fevereiro 13, 2020

Kill the Dead
★★★☆☆
Sinopse:
James Stark, a.k.a. Sandman Slim, crawled out of Hell, took bloody revenge for his girlfriend's murder, and saved the world along the way. After that, what do you do for an encore? You take a lousy job tracking down monsters for money. It's a depressing gig, but it pays for your beer and cigarettes. But in L.A., things can always get worse. Like when Lucifer comes to town to supervise his movie biography and drafts Stark as his bodyguard. Sandman Slim has to swim with the human and inhuman sharks of L.A.'s underground power elite. That's before the murders start. And before he runs into the Czech porn star who isn't quite what she seems. Even before all those murdered people start coming back from the dead and join a zombie army that will change our world and Strark's forever. [KADREY, Richard. Kill The Dead. HarperCollins Publishers (2013)]


Opinião:
Li o primeiro livro desta série, Sandman Slim, em Janeiro e achei-o um dos melhores que me passou pelas mãos nos últimos tempos (se quiserem, espreitem a opinião de Sandman Slim #1 aqui no blogue). Fiquei de tal forma convencida que foi um dos poucos a que atribuí cinco estrelas sem sequer pestanejar. Já neste Kill the Dead não posso dizer que tenha sentido o mesmo entusiasmo e a certo ponto tive até alguma dificuldade em acompanhar o desenrolar da história.

Kill the Dead passa-se seis meses depois dos acontecimentos de Sandman Slim. As peripécias nas quais Stark se envolveu no passado levaram-no a ganhar uma certa reputação e, consequentemente, a tornar-se numa espécie de celebridade underground local. Apesar disso, parece estar a atravessar uma crise existencial, e para além dos ocasionais trabalhos em regime freelance que faz para Lúcifer e para os Golden Vigil, a sua vida resume-se a estar ao balcão da Bamboo House of Dolls a beber e fumar.


« I don't know what I'm doing anymore. 
There is no reason for me to exist. 
I kill things I don't care for people I hate. »

Esta auto-comiseração e crise existencial foi um dos aspetos de que não gostei particularmente. No primeiro livro, o objetivo de Stark era claro: vingar-se daqueles que o enviaram para o Inferno e mataram a sua namorada. Em Kill the Dead não há propriamente um objetivo, até começarem a desaparecer membros de algumas das mais importantes famílias ligadas aos Sub-Rosa e ele decidir ir investigar. Mas até que as coisas comecem a animar, ainda teremos uns quantos parágrafos (cof*cof*praticamente metade do livro cof*) pela frente.

Portanto, comecei a leitura cheia de entusiasmo e sempre à espera do que ia acontecer. Sempre que surgia algum detalhe mais fora do normal começava a pensar que era aquele o gatilho que ia dar origem ao desenrolar da história mas, quanto mais avançava, mais ia percebendo que estava enganada. A determinado ponto comecei a achar que se calhar a ideia deste livro era só falar sobre o dia a dia de Sandman Slim quando não estava a matar monstros...

Foi só já a mais de metade que as coisas começaram a aquecer, e sobretudo depois do aparecimento de uma das minhas personagens favoritas, uma « czech gypsy porn-star zombie killer » chamada Brigite Bardo. Ainda aqueceram mais quando ela fez questão de explicar - e demonstrar - ao nosso monster slayer como é que se mata um zombie, e acreditem que é bem diferente da já conhecida técnica de destruir o cérebro.



Seja como for, e apesar de encontrarmos aqui uma abordagem bastante diferente daquela a que estamos habituados, achei que resultou muito bem. Richard Kadrey agrupou os zombies em categorias, que vão dos totalmente desprovidos de qualquer capacidade de raciocínio, aos que vivem de tal forma integrados que dificilmente alguém diria estarem mortos.  Para os fãs de zombies, isto pode parecer uma blasfémia mas, a única verdadeira vítima de blasfémias aqui é a bíblia.

Dizem que com coisas sagradas não se brinca e, se considerarmos esta afirmação como se de uma verdade insofismável se tratasse, então o mais certo é o Richard Kadrey ir arder nas labaredas do Inferno. À semelhança do primeiro livro, também em Kill the Dead vamos ter algumas referências a personagens e eventos bíblicos, como é o caso da história de Caim.

Como sabem, Adão e Eva foram expulsos do Éden. Depois disso, e porque não dava para andar a arrancar costelas para fazer mais homens, lá tiveram de procriar da forma natural e tiveram dois filhos: Caim e Abel. O primeiro decidiu tornar-se agricultor, enquanto que Abel optou por se dedicar à pecuária.

Como provavelmente ambos sofriam ambos de Síndrome de Estocolmo, praticavam atos de adoração a Deus, como oferendas. Abel, o pecuário, oferecia as primícias, ou seja, o conjunto dos primeiros produtos do rebanho que, neste caso, era a melhor ovelha. Caim, o agricultor, oferecia o que sobrava da colheita. Mas Deus, que pelos vistos não é adepto do combate ao desperdício alimentar, achava que Caim fazia as ofertas como mera formalidade e não como um ato de devoção.

Esta diferenciação acabou por gerar mau ambiente entre os irmãos e Caim, movido por cíumes, matou Abel. Deus, que foi quem no fundo provocou esta confusão toda, condenou Caim a errar eternamente pela terra como « fugitivo e vagabundo ». Não fosse isto o suficiente, ainda adicionou aquilo a que se chama "a marca de Caim" e que é uma espécie de promessa de proteção divina contra uma morte prematura. Ou seja, não bastava o tipo ter de errar pelo mundo fora, Deus ainda fez questão de que esse sofrimento se prolongasse por tanto tempo quando possível. Nada mau para um Deus misericordioso, hein? Depois ainda me perguntam porque é que sou ateia...

Em Kill the Dead, uma das histórias da origem dos zombies funde-se com a de Caim e Abel e a marca de Caim era, na verdade, o facto de ele ser zombie. O que acham disto? Pessoalmente, adorei.



A única desilusão neste livro, no que diz respeito às personagens, foi a figura de Lúcifer. Para ser franca, não sei bem do que estava à espera mas certamente não era daquela figura aparentemente frágil e pouco imponente. Mas como li o livro e ouvi o audiobook em simultâneo, a forma como o narrador, MacLeod Andrews, interpretou Lúcifer pode ter-me condicionado visto que era uma fala assim meio arrastada e cheia de maneirismos.

De qualquer modo, aquele que foi para mim o principal ponto franco foi mesmo o tempo que a ação demorou a arrancar. Achei que nesse aspeto, o primeiro livro da série foi muito mais entusiasmante. O Kill The Dead também acaba por arrebitar, mas até lá chegarmos é um suplício...

Mas, como ainda me faltam nove livros para terminar a série Sandman Slim, ainda vou dar uma oportunidade ao Richard Kadrey para se redimir.

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