A Caminhada (2016) de Drew Magary
★★★★★
Sinopse:
Certo dia, Ben decidiu fazer uma caminhada. Não contava estar fora tanto tempo. Nessa noite iria ter uma reunião de trabalho noutra cidade e, no dia seguinte, voltaria para casa, para junto da família. Não esperava perder-se. Não esperava encontrar uma cena de um terror inimaginável, que o obrigaria a fugir por um caminho longo e tortuoso, que o levaria a um mundo de gigantes devoradores de homens, demónios bizarros e insectos colossais. Não esperava encontrar-se numa jornada de proporções épicas, de vida ou morte - auxiliado por um crustáceo profano e diversos objectos mágicos, ferramentas e poções - forçado a procurar uma entidade misteriosa conhecida como « Produtor », ao longo de um caminho que irá testar a sua resiliência e a profundidade da sua alma. Ele nao esperava nada daquilo. [Fonte: MAGARY, Drew. A Caminhada. Coimbra: Minotauro, 2017]
Opinião:
Este livro já estava na minha lista de próximas leituras há algum tempo mas, como eu sou uma daquelas pessoas que lê muito, raramente compro livros que custem muito mais do que dez euros.
Normalmente o que faço é ir passando na FNAC das Amoreiras para ver se há alguma promoção, espreitar o site da wook para ver se algum dos livros da minha wish list está com desconto e, claro, passo algum tempo no olx à procura de oportunidades de livros.
Ora, sucede que A Caminhada normalmente custa à volta de 18 euros, motivo pelo qual ainda não tinha comprado até ao dia em que passei pela Bertrand do Monumental "só para ver" e lá estava ele mesmo à entrada com uma etiqueta que dizia « preço mini 10 € ».
Claro que, apesar de ter entrado sem intenção de comprar nada, há oportunidades que não se podem deixar passar, certo ? E um desconto de quase oito euros é uma delas ... E foi assim que acabei por sair da Bertrand com um livro que não ia com intenções de comprar, e acerca do qual apenas tinha a vaga ideia que envolvia um passeio pelo floresta e vários obstáculos para superar. Apesar disso, uma coisa vos posso garantir: até agora, é o melhor livro que li em 2019, apesar de continuar a ter alguma dificuldade em encaixá-lo numa categoria.
Terror ? Sim... mas ao mesmo tempo, nem por isso.
Humor ? Definitivamente! Mas, também não é bem isso ...
Fantasia ? Muita! Mas por outro lado, vai além da fantasia ...
Filosofia ? De certo modo sim ...
Aventura ? Sim, a cada página ...
A Caminhada consegue ser uma mistura de tudo isto e um pouco mais porque, na realidade, nunca sabemos o que vem a seguir. A sério. Senti-me surpreendida página, após página, após página ... e quando achava que já estava a apanhar o padrão e que conseguiria antecipar mais ou menos o que se seguia ...
Porque há coisas que não se antecipam.
E um caranguejo falante é uma delas.
A história começa com a chegada de Ben a « um pequeno resort na montanha (...), um daqueles locais para casamentos (...) Havia uma villa completa de bungalows para festas de casamento, bem como um pequeno coreto, onde um fotógrafo insistente conseguia manter sequestrada uma dúzia de convidados durante quarenta e cinco minutos, sem acesso a qualquer cocktail » (pg.12).
Nessa noite iria ter uma reunião de trabalho e contava regressar a casa, para junto da esposa e dos dois filhos, no dia seguinte. Até aqui, tudo normalíssimo.
Mas Ben sentia-se com vontade de esticar as pernas e acabou por descobrir que « por detrás do edifício principal da estalagem havia um caminho em cascalho e um telheiro » (pg.14), depois do qual « conseguia ver um carreiro plano, que seguia em direcção ao campo. Parecia-lhe um trilho » (pg.14).
Rapidamente percebemos que Ben não é propriamente um especialista em trilhos e que, com aquele passeio, procurava apenas fazer uma pequena pausa, apanhar ar fresco e desligar-se - ainda que apenas por pouco tempo - do mundo. Desde o início que me identifiquei logo com ele porque, se estivesse no seu lugar, provavelmente faria exactamente o mesmo: saía para explorar as imediações. E, tal como ele, tomaria pequenas anotações no telemóvel para não me perder no caminho de volta: « duas árvores com troncos divididos no cruzamento » (pg.18). Claro que me iria perder na mesma porque não tenho sentido de orientação nenhuma, daí que tenha optado por um marido com GPS integrado.
Tudo normal até agora ...
Ok, o Ben ficou sem rede no telemóvel mas, são coisas que acontecem, certo ?
De certeza que quando chegar a um ponto mais alto já deve apanhar rede.
Ben vai-se embrenhando lentamente no caminho e com ele, também eu me fui embrenhando lentamente na história até que ...
« Foi então que viu um homem: alto e corpulento, vestindo uma camisa de ganga e uns jeans baratos, a arrastar um corpo para fora do barracão. O corpo era pequeno e tinha vestido uma camisa de noite com cupcakes. Não tinha pés. (...) A cara do homem não era bem visível. Estava coberta pela pele esfolada do focinho de um rottweiler preto, orelhas incluídas. » (pg.19)
E a partir daqui, acreditem, vai ser a porra de uma montanha russa, onde a linha entre a realidade e a fantasia se vai esbatendo progressivamente, até chegarmos àquele ponto em que vamos aceitar tudo como normal. O que eu quero dizer com isto é que - não sei se também acontece convosco - temos tendência a encontrar uma explicação racional para as coisas, tentando manter tudo no plano mais realista possível. Mas, durante A Caminhada, deparamo-nos com tantos obstáculos irrealistas que, a determinado ponto, acabamos por aceitar tudo como sendo normal. Um insecto de proporçoes gigantes ? Been There, Done That.
Claro que durante as primeiras páginas vamos resistir... Oh sim, vamos resistir e tentar encontrar explicações como « Ele na verdade adormeceu na estalagem e isto é tudo um sonho! ». Vamos ficar admirados com pedidos estranhos, feitos por personagens estranhas, como a Sr.ª Blackwell que apenas pede que Ben arranque as ervas daninhas do jardim e em troca compromete-se a ajudá-lo a chegar à vila mais próxima, Courtshire. Mas, acreditem, vai chegar a um ponto em que até uma gigante devoradora de homens vos vai parecer "normal".
Uma coisa é certa: para sobreviver, Ben tem de se manter no caminho. E não falamos de um caminho no sentido metafórico da palavra, visto que o caminho que ele tem de seguir está realmente assinalado. Ao longo dele, várias armadilhas estrategicamente colocadas, que o seduzem a abandoná-lo em troca da satisfação imediata que a armadilha promete.
MANTEM-TE NO CAMINHO, OU MORRES
A melhor forma de ilustrar a ideia é espreitando para, imagine-se, a capa do livro! É verdade ... Há livros em que as capas não parecem ter nada a ver com o conteúdo (agora, por exemplo, estou a ler "A Mulher Comestível" da Margaret Atwood e a capa são rosas ...) mas neste caso a capa, da autoria de Will Sweeney, está tão brilhante que ilustra realmente, não só o caminho, como os obstáculos com que Ben se vai deparar, o que deu origem a várias espreitadelas à capa para fazer corresponder aquilo que estava a ler àquilo que o autor ilustrou. Mais um ponto a favor !
Claro que não vos vou dizer que é um livro que toda a gente tem de ler, porque tenho perfeita noção que há pessoas que não iam achar piada nenhuma. Da mesma forma que eu também não acho graça nenhuma a livros do feng-coiso, romances melosos e livros de auto-ajuda. Gostos são gostos e, tal como os cús, cada um tem o seu e faz com ele o que quiser. Se gostam de livros mais sérios, definitivamente não vão gostar deste livro ... Por outro lado, se gostam de ser surpreendidos, A Caminhada é um livro que têm de ler!
E o que dizer daquele final ... ?
Já conheciam A Caminhada ou algum outro livro de Drew Magary ?
O que acharam ?
Contem-me tudo nos comentários!
2 comments
Parabéns pelo Blog.
ResponderEliminarEncotrei ele hoje, por um acaso, ao pesquisar sobre um livro. e estou adorando. Abço
Awwww muito obrigado pelo teu comentário! fico feliz que tenhas gostado :) um beijinho grande
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