A Hora do Vampiro (1975) de Stephen King

by - fevereiro 01, 2019

★★★☆☆

Sinopse: 
Ben Mears. um escritor de sucesso, regressa ao Lote de Jerusalém (também conhecido como Lote de 'Salém'), no Maine, para escrever um livro acerca da casa que o assombra desde criança. Ao chegar à sua cidade natal, depara-se com um cenário de pesadelo: a cidade, isolada, está infestada de vampiros, que espalham o caos e a morte. Na esperança de conseguir travá-los, Ben Mears consegue reunir um pequeno grupo de pessoas para combater o Mal que invadiu a cidade.
Segundo romance de Stephen King, A Hora do Vampiro, tornou-se uma referência mundial na literatura de terror. [Fonte:KING, Stephen. A Hora do Vampiro. Lisboa: Bertrand Editora, 2010.]



Opinião: 
Stephen King é Stephen King e, apesar de não ser um dos meus escritores favoritos - sobretudo porque acho que os finais dos livros são sempre muito apressados - uma coisa é certa: ele sabe como contar uma história e, talvez seja essa a razão pela qual muitos dos livros acabaram adaptados ao cinema.

Hoje em dia, com as redes sociais, é bastante simples promover e divulgar um filme. Por exemplo, à data em que comecei a trabalhar nesta review (31 de Dezembro) anda tudo enlouquecido com a Bird Box e o novo filme interactivo do Dark Mirror: Bandersnatch.


Bird Box Black Mirror

Mas recuemos aos anos 80 e à inexistência das redes sociais, telemóveis sem acesso à internet e por aí fora. Mesmo assim, os filmes tornaram-se bastante conhecidos e, consequentemente, também o autor dos livros nos quais se basearam. Acho que não deve haver ninguém da minha geração que não tenha já visto o The Shining ou o Carrie em tenra idade ... Mesmo actualmente, continuam a sair novas adaptações, como o IT, e portanto acho que o Stephen King acaba por se tornar num daqueles autores multigeracionais. Afinal de contas, existirão sempre fãs de terror (ou talvez não, considerando que actualmente temos putos com onze anos que a única coisa que vêem é o Canal Panda. O horror!).

Stephen KingStephen KingStephen King

Mas adiante ...
Eu já conhecia alguns dos filmes mas, o único livro que tinha lido era o The Shining e portanto, em 2017, decidi dedicar-me a uma leitura mais intensiva e durante uns meses, não fiz mais nada que não fosse ler Stephen King.


Stephen King Stephen King Stephen King
Stephen King Stephen King Stephen King
Stephen King Stephen King Stephen King
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Para além destes, li mais uns quantos mas A Hora do Vampiro foi um dos que não me passou pela mão. Até que, em 2018, o outro leitor cá de casa decide que quer ler aqueles que pelos vistos são considerados os melhores livros de Stephen King: IT e Salem's Lot. Durante a leitura ia fazendo um ou outro comentário que serviu para perceber que o Salem's Lot (traduzido para português como A Hora do Vampiro) parecia ser realmente um bom livro mas eu não estava minimamente receptiva a ler o livro em inglês - até porque não gosto assim tanto de Stephen King - e o assunto ficou esquecido. Até que no Natal vejo o livro na estante de casa da minha mãe e ...




Comecei a lê-lo no dia 30 de Dezembro e a leitura fluiu como habitualmente flui nos livros de Stephen King: muito rapidamente. E portanto, no dia 4 de Janeiro, já o livro estava à espera para ser devolvido.

A Hora do Vampiro é o segundo livro de Stephen King, precedido apenas por Carrie. Publicado em 1975, quando o autor tinha apenas 28 anos, continua a ser, ainda hoje, considerado um dos seus melhores livros, juntamente com The Stand e It.

Stephen KingIt Stephen King

Infelizmente, tive com este livro exactamente o mesmo problema que tive com todos os livros deste autor que li anteriormente: o final. Isto acaba por se tornar extremamente irritante porque toda a gente parece delirar com o mestre do terror e a mim acontece-me sempre chegar ao final e ... meh.

A Hora do Vampiro não foi excepção e, à medida que me aproximava do final, ia ficando cada vez mais desapontada porque havia coisas que não faziam sentido nenhum. Mas já lá vamos.

A história passa-se em Jerusalem's Lot, « uma pequena cidade a leste de Cumberland e a trinta e dois quilómetros de Portland » (pg.16), « à qual os seus habitantes chamavam familiarmente o Lote, e onde pouca coisa de nota alguma vez aconteceu » (pg.17). No entanto, nas cidades vizinhas, o Lote ganhou « a reputação de cidade assombrada » (pg.19) e é fácil perceber porquê.


« Não há um único negócio aberto. O último a desaparecer foi a loja de conveniência e a farmácia Spencer, que fechou as suas portas em Janeiro. A loja de material agrícola Crossen, a loja de ferragens, a loja de mobília Barlow and Straker, o Excellent Café e até o edifício da Câmara estão entaipados.» (pg.20)

No entanto, parece haver uma « falta de vontade, ou incapacidade, para falar do Lote de Jerusalém e do que terá aí acontecido, se é que alguma coisa aconteceu » (pg.17) e assim, o que quer que seja que tenha levado a que esta cidade tivesse definhado e desaparecido, permanece uma incógnita.

Neste caso, talvez não seja assim uma incógnita tão grande visto que o título do livro é A Hora do Vampiro e portanto, sabemos desde o início que, seja o que for que tenha acontecido, envolve vampiros.


Salem's Lot Stephen King

O livro começa por nos introduzir a duas das personagens que assumirão um papel central nesta história, um homem e um rapaz que « toda a gente pensava (...) que eram pai e filho » (pg.13), e que « atravessavam o país num velho sedan citröen viajando numa linha incoerente » (pg.13), sempre por estradas secundárias, e vivendo de pequenos trabalhos que iam conseguindo arranjar ao longo do caminho. Desde logo que percebemos que algo de suspeito se passou porque, das duas uma: ou estão a fugir de alguma coisa, ou porque fizeram alguma coisa. Na minha opinião, foi um ponto de partida interessante e funciona muito bem como gatilho para prender a atenção do leitor.

Stephen King faz-nos depois até recuar ao passado ano de 1975, aquele que seria o ponto de partida de tudo o que estava para vir. Ben Mears, um escritor com dois livros publicados e a trabalhar no terceiro, decide regressar a Salem's Lot, local onde viveu até aos nove anos, decidido a enfrentar um pesadelo de infância que envolve a casa Marsten, uma mansão situada no topo de uma colina que alguns habitantes julgam ser assombrada.


Salem's Lot - Stephen KingSalem's Lot - Stephen King

Salem's Lot é a típica aldeia rural, e quando digo típica refiro-me ao facto dos seus habitantes serem a personalização dos estereótipos usualmente associados aos campónios, « a ideia de que as pequenas cidades são colmeias de escumalha e vilania » (fonte: goodreads). Assim sendo, vamos ter, como seria de esperar:

A coscuvilheira da cidade, Glynis Mayberry, que aproveita o facto das linhas telefónicas serem partilhadas para ouvir as conversas alheias. 

Eva Miller, viúva de um empresário e proprietária da pensão de Salem's Lot. Uma mulher trabalhadora que mantêm tudo a funcionar e que, após a morte do marido, teve uma relação com Weasel Craig.

Weasley Craig, um dos residentes permanentes da pensão. Gosta de beber mais do que aquilo que consegue suportar. Paga a estadia na pensão através de pequenos trabalhos que vai realizando a pedido de Eva Miller.

Lawrence Crockett, um vendedor imobiliário que não se faz rogado em fazer negócios suspeitos se disso conseguir tirar algum benefício. Foi ele quem vendeu a Casa Marsten a Straker, mesmo depois de ter percebido que havia alguma coisa pouco clara quanto às intenções e motivações do seu comprador.

O bully da escola, Richie Boddin.

O trio amoroso composto por Corey Bryant, o tipo da companhia dos telefones que espera ansiosamente que Reggie Sawyer - o mecânico de Jerusalem's Lot - vá trabalhar para correr até casa dele, onde Bonnie Sawyer o espera de avental e sapatos de salto alto.

A família disfuncional da roulotte, composta por uma mãe frustrada, Sandy McDougall, um bebé vítima de maus tratos, e um marido que passa os dias fora (Isto pode soar estranho mas as cenas em que o Randy é espancado pela mãe estão muito bem apanhadas! Stephen King conseguiu captar com perfeição o desespero da mãe, o crescente estado de irritação que leva a que agrida a criança e o consequente estado de arrependimento.)

A força da lei, composta por Nolly Gardener e Parkins Gillespie. O primeiro, não particularmente inteligente mas bastante ambicioso. O segundo, nada ambicioso mas muito mais perspicaz do que parece.

E por aí fora...


salems lot stephen king salems lot stephen king

Portanto, como vêem, temos o leque completo de personagens que normalmente compõem qualquer livro ou filme cuja cenário é uma cidade no meio de nenhures.

Para mim, um dos aspectos positivos deste livro são, precisamente, as personagens! A descrição está de tal forma detalhada - sem ser excessiva ou se tornar aborrecida - que tudo se torna incrivelmente realista, fazendo com que fiquemos com a sensação que já estivemos em Salem's Lot.

- O Dell's ? Claro que conheço! Jarros de budweiser a 1 dólar e quarenta, o Weasel a gastar o cheque todo em bebida até finalmente cair para o lado e alguém ter de o levar a casa...

Sendo Salem's Lot uma cidade pequena, é inevitável que, a determinado ponto, as vidas e os destinos das personagens se comecem a entrançar, num emaranhado cada vez mais complexo e, normalmente, com Ben Mears directa ou indirectamente relacionado.


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David Soul no papel de Ben Mears | Salem's Lot (1979)

Começa com a formação do par romântico: o autor forasteiro que escreve livros com cenas atrevidas, com a jovem instruída da vila que prefere fugir do destino pré-determinado pela mãe e rumar em direcção a Nova Iorque, onde espera conseguir viver com o dinheiro da venda das ilustrações que faz. 

Soa familiar, não soa ? 
A história já está tão vista, mas continua a resultar! 
Pelo menos comigo resultou muito bem e, ao fim de algumas páginas, desejava genuinamente que corresse tudo bem entre eles.

A par do par romântico, temos uma outra personagem bastante relevante: Mark Petrie, o miúdo cuja cara tinha « um ar impotente e livresco » (pg.77), mas que decide responder à provocação do bully e enfrentá-lo.


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Lance Kerwin no papel de Mark Petrie | Salem's Lot (1979)

Será a caminho da casa de Mark que vai desaparecer aquela que será a primeira vítima. Claro que daqui para a frente já podem imaginar o que se segue porque, se já viram algum filme com vampiros, já sabem que eles voltam sedentos de sangue, mordem alguém, este alguém por sua vez também volta sedento de sangue ... o resto já sabem.

O livro segue depois a fórmula de tantas outras histórias do género: a eterna luta do Bem contra o Mal.

Um aspecto que achei realmente interessante no livro é o facto das personagens reconhecerem já terem ouvido falar de vampiros ou, pelo menos, já terem lido alguma obra de ficção acerca disso. 

Mas porque raio é que eu aponto isto como uma coisa realmente interessante ?

Porque confere um realismo do caraças! 
Reparem: se houvesse uma epidemia de vampiros, vocês já saberiam que:

#1 Eles detestam o sol.
#2 Dormem durante o dia e matam durante a noite.
#3 Não gostam de alho, água benta ou crucifixos.
#4 Para os matar têm de lhes espetar uma estaca de madeira no peito.

Mas o que é que normalmente acontece nos livros de vampiros ? As pessoas parecem nunca ter ouvido falar de tal coisa: - Já olhaste bem para o Miguel ? No outro dia apareceu aí com umas marcas no pescoço e desde então nunca mais foi o mesmo. Não quer ir beber a bica porque diz que está muito sol, começou a faltar ao emprego porque diz que só consegue dormir de dia... no outro dia parece que apanhou a Filomena no elevador e se atirou a ela! Cá para mim deve ser uma dessas viroses que para aí andam ... 



Por isso, quando no livro a equipa que se forma para enfrentar o vampiro é composta por « um velho professor obcecado com os livros, um escritor obcecado com os pesadelos de infância, um rapaz pequeno que fez um curso de pós graduação em folclore vampírico com filmes e literatura de cordel moderna » (pg.349) e Susan Norton, uma jovem recém licenciada que quer sair de Salem's Lot, é inevitável que o leitor sinta uma certa empatia porque, nenhum deles é propriamente um Dr. Van Helsing e todos eles se vêem perante o mesmo dilema: por um lado, todos os indícios apontam para que o que se está a passar é causado por vampiros ... Mas por outro lado, estamos a falar de vampiros, e toda a gente sabe que os vampiros não existem, pois não ?


* * * A  V  I  S  O    D  E    S  P  O  I  L  E  R  S * * *

O vampiro propriamente dito não aparece muitas vezes, o que na minha opinião até contribui para manter toda a história envolta numa tenebrosa aura de mistério. É apenas através das suas acções que vamos sabendo que é extremamente inteligente, cauteloso, calculista, e que parece estar sempre um passo à frente daqueles que o tentam caçar... 

E quando ele finalmente aparece, vai compensar toda a espera. 
Pessoalmente, já tinha formado a ideia de que era alguém extremamente poderoso e, quando se dá a confrontação com o padre Calahan - a melhor parte do livro, que até faz com que os pelos dos braços fiquem no ar - essa ideia fica ainda mais vincada e terminamos com a sensação que nada o pode deter e que estão todos condenados à morte. Provavelmente ele vai conseguir fazer tantas vítimas que acabará por estender a sua rede de vampiros para outras cidades, daí para o mundo, e em pouco tempo teremos uma epidemia global.

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Reggie Nalder no papel de Kurt Barlow | Salem's Lot (1979)

Mas não. 

Nada disso acontece e é por isso que digo que os finais dos livros de Stephen King me deixam sempre desiludida. Se o livro fosse mau do início ao fim, não me queixava tanto... O problema com os livros dele que já li é que são absolutamente extraordinários e de repente acabam de uma forma que me parece demasiado rápida. Ou seja, depois de umas centenas de páginas a deixar no leitor a ideia de que o vampiro Barlow é poderoso e perspicaz, ele acaba com morto pela dupla Ben Mears (o escritor) &  Mark (o Van Helsing junior) com uma estaca espetada no coração. Nem sequer deu um bocadinho de luta...


* * * F  I  M    D  E    S  P  O  I  L  E  R  S * * *


Seja como for, e apesar de não ter gostado da forma abrupta como o livro terminou, mantenho aquilo que disse inicialmente: Stephen King é realmente um excelente contador de histórias e isso garante que vão ficar colados ao livro.

Se, como eu, andam de transportes públicos, o livro é-vos especialmente indicado porque 
vão ficar tão embrenhados que não vos vai fazer diferença se a carreira é suprimida e têm de esperar meia hora pelo autocarro alternativo que só vos leva até metade do percurso.


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